A Era dos Antibióticos (II)

Artigo de opinião publicado no “Diário de Notícias” 5 julho 2023

Já aqui foi resumida, em artigo anterior, a história da descoberta da penicilina, em 1928, pelo médico escocês Sir Alexandre Fleming. A este propósito, sublinhou-se que a penicilina foi colocada no mercado pela Indústria Farmacêutica, apenas em 1941.

Viria, desde então, a tratar, curar e salvar muitos milhões de doentes, em todo o mundo, diagnosticados com problemas de infeções bacterianas que anteriormente não dispunham de tratamento específico.

Cedo, porém, foram identificadas certas estirpes de bactérias que tinham adquirido resistência à penicilina, fenómeno que ainda foi observado por Fleming antes da sua morte, ocorrida em 1955.

Para compreender o aparecimento, inicialmente inesperado, de bactérias resistentes é preciso, antes de tudo, destacar que a característica da resistência reside na própria bactéria e não no doente. É, assim, inteiramente errada a ideia que alguns doentes poderão ainda ter no sentido de julgarem que devido ao facto de quase nunca tomarem antibióticos, quando os tomam eles fazem rapidamente efeito…

Opinião errada, saliente-se novamente. Ora, o efeito ou a eficácia de determinado medicamento antibiótico não tem qualquer relação com os hábitos anteriores do doente que é medicado para combater uma infeção de origem bacteriana.

A ação do antibiótico está unicamente relacionada com a bactéria que provoca a infeção que precisa de ser devidamente tratada e curada. É o agente bacteriano que pode ser sensível ou resistente ao antibiótico. Se for sensível a cura da infeção será certa. Se a bactéria for resistente ao antibiótico não fará qualquer efeito terapêutico. Neste caso a infeção pode agravar-se, ou complicar-se e evoluir para a cronicidade ou, mesmo, levar à morte do doente.

Imagine-se, o seguinte cenário, aliás muito provável: um cidadão de 40 anos de idade, em plena saúde aparente, sai do seu local de trabalho em Lisboa e ao final do dia regressa a sua casa no Seixal, onde reside com mulher e dois filhos, um deles recém-nascido. Ao entrar no barco, no Cais do Sodré, para atravessar o Tejo, à hora de “ponta” inala passivamente as gotículas da tosse de um passageiro que estava a seu lado, apertado, na mesma fila. Imagine-se, também, que essas gotículas continham bactérias de tipo estreptococos, resistentes à penicilina, que o tal que passageiro tinha alojadas na sua orofaringe e que as transmitiu ao outro que estava junto de si…

São incidentes de situações, análogas à agora descrita, que devem estar presentes no pensamento de todos os cidadãos. Mas, mais do que isso, devem guiar os comportamentos, de molde a prevenir riscos facilmente evitáveis. Nesta circunstância, o passageiro a caminho de casa devia estar protegido ou ter evitado as horas com mais aglomerações de pessoas e o outro, ao tossir, teria que ter observado as normas de etiqueta respiratória aconselhadas pela Direção-Geral da Saúde.

Por outo lado, os serviços de saúde pública têm que continuar a insistir na difusão de conselhos destinados à prevenção e controlo de infeções respiratórias.

A seguir, em artigo próximo, procurar-se-á esclarecer a génese do aparecimento da resistência de bactérias aos antibióticos, bem como as principais medidas que visam reduzir o problema na perspetiva ONE HEALTH que envolve, necessariamente, a saúde humana, animal e a agricultura.

Francisco George
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