João Simões (1908-1995)

João Simões era um Homem de rara qualidade. Associava, de forma absolutamente ímpar, a discrição à competência. Cultivava a serenidade. Nascido em Lisboa, em 1908, viria a morrer em Beja, aos 87 anos de idade (1995). Conheci-o muito de perto, em família, uma vez que casei, em 1970, com sua Filha Maria João.

Arquitecto pela Escola de Belas Artes de Lisboa desde 1932, João Simões, por genuína sobriedade que marcava a sua personalidade, não exibia o sucesso que alcançara ao longo da sua vida dedicada à arquitectura e à construção de notáveis obras modernistas.

Republicano convicto, participou activamente nos movimentos da Oposição Democrática a Salazar. Porém, essa condição não o impediu de colaborar com o ministro Duarte Pacheco em grandes obras públicas que marcaram a época, nomeadamente o Hospital de Santa Maria, a Escola de Enfermagem do IPO (1), mas também os Armazéns Frigoríficos de Alcântara (2), a Casa da Imprensa, os estádios Universitário (Lisboa) e do Braga ou, ainda, a Caixa Geral dos Depósitos da Figueira da Foz e muitos outros trabalhos, incluindo equipamentos industriais e de habitação, igrejas e edifícios públicos e privados. Galardoado duas vezes com o cobiçado Prémio Valmor, João Simões integrou com Cassiano Branco, Veloso Reis Camelo, Raul Martins, Faria da Costa e Francisco Keil do Amaral, entre outros, o movimento de intervenção que impôs qualidade e novo estilo às edificações urbanas.

Antigo jogador de futebol no estádio das Amoreiras do Sport Lisboa e Benfica, João Simões aceita o desafio do Presidente do Clube Joaquim Ferreira Bogalho para desenhar um novo estádio nos terrenos da Luz.

Quando, pela primeira vez, entrei na sua casa no número 8 da Rua Alexandre Braga, ainda senti o ambiente do atelier então preparado para receber os grandes estiradores que tinham sido ali colocados para facilitar o trabalho de concepção do projecto de arquitectura do novo Estádio.

Maria João, que tinha nascido em 1948, foi, naturalmente, influenciada por estes trabalhos de seu Pai que, depois do jantar, pela noite até alta madrugada, em cima dessas grandes mesas, desenhava sem parar. Por vezes, via-o, verdadeiramente, a gatinhar em cima dos estiradores com a lapiseira numa mão e régua na outra. Relatava-me pormenores dessas memórias com um misto de admiração e orgulho. O pensamento do arquitecto transposto para desenho em papel, representava, para Maria João, um fascínio que terá sido decisivo na opção que, depois, viria a tomar pelo curso de arquitectura nas Belas Artes de Lisboa que iniciou em 1966.

O Estádio seria inaugurado no dia 1 de Dezembro de 1954 com quase 50 mil lugares distribuídos nos seus magníficos dois anéis. A sua construção fora possível graças às numerosas sacas de cimento oferecidas pelos benfiquistas, às cotizações suplementares espontâneas e ao trabalho voluntário dos sócios que aos fins-de-semana se apresentavam nos estaleiros da obra.

Mais tarde, João Simões conduz os estudos da primeira fase do terceiro anel. A partir de 1960 a Luz passa a receber 80 mil espectadores.

Em 1985, a conclusão do outro terceiro anal passou a fazer da Luz a “grande catedral” com a possibilidade de receber 120 mil assistentes (passa a ser o maior estádio da Europa e o 3º maior de Mundo).

Em 2003, 49 anos depois da inauguração, foi demolido.

João Simões gostou muito de ter desenhado o “seu” Estádio. Pela primeira vez utilizara betão pré-esforçado. À semelhança da generosidade demonstrada pelo conjunto da massa associativa, também ele ofereceu o seu trabalho ao Clube, tal como o tinha feito enquanto jogador de futebol (3). Outros tempos…

Francisco George
Março de 2013

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