A Era dos Antibióticos (III)

Artigo de opinião publicado no “Diário de Notícias” 12 julho 2023

Em continuação de artigos anteriores sobre o mesmo tema, procurar-se-á, hoje, esclarecer a génese do aparecimento de resistências de bactérias aos antibióticos.

Antes de tudo, note-se que as bactérias patogénicas (isto é, que provocam doenças) são seres vivos, microscópicos, que se multiplicam por cisão binária: uma bactéria divide-se em duas, depois quatro, oito, dezasseis…

Há múltiplas espécies de bactérias que para efeitos de classificação taxonómica são agrupadas em géneros. Apresentam morfologia e dimensões variadas. Tanto podem assumir a forma esférica ou de bastonete ou de espiral. As primeiras são designadas como cocos, as segundas de bacilos e as últimas de espiroquetas.

Em geral, as bactérias medem entre 0,5 a 5 micrómetros (o micrómetro é a unidade do sistema métrico mil vezes mais pequena que o milímetro). Assim sendo, só são visíveis com lentes do microscópio ótico e por isso, têm a designação de microrganismo.

O efeito patogénico das bactérias resulta da sua multiplicação que é a causa da infeção (traduzida por febre e outros sintomas e sinais).

Como já exposto, a penicilina impede a multiplicação das bactérias (daí a designação de antibiótico).

Porém, pouco depois da sua introdução no mercado, identificaram-se certas bactérias (como os estafilococos, por exemplo) que passaram a produzir uma enzima capaz de inativar a penicilina, razão pela qual recebeu o nome de penicilinase. Nesta situação, a penicilina deixa de ter efeito antibiótico quando a bactéria segrega penicilinase. Ora, esta propriedade, uma vez adquirida, passa a ser “comandada” pelos próprios genes, integrados no património genético da bactéria. É, portanto, transmitida às sucessivas gerações de bactérias no âmbito do processo normal de multiplicação. Quase sempre, essa característica da resistência surge por um mecanismo biológico de pressão seletiva natural como resultado do contacto da bactéria com a penicilina. Nestes termos, as resistências ocorrem devido a mutações espontâneas ou, por outro lado, através da incorporação de material genético sob a forma de plasmídeos.

Repare-se que os plasmídeos são fragmentos ínfimos de material genético das bactérias, mas que se separaram do genoma bacteriano; têm a capacidade de se multiplicarem por si e de invadirem outras bactérias, mesmo de espécies diferentes (são cadeias circulares de ADN, independentes, que circulam livremente). Como os plasmídeos transportam genes das resistências aos antibióticos, a sua propagação no ambiente representa um problema, incluindo nos sistemas de abastecimento de água para consumo humano. Deste modo, os plasmídeos são poluentes ambientais que colocam em risco a saúde pública ao impedirem o efeito dos antibióticos.

Em Portugal, os membros dos órgãos de soberania não têm assumido este desafio com a necessária energia. Ainda há muito trabalho preventivo pela frente.

Em sentido contrário, há que aplaudir os que mais se destacam na proteção de antibióticos. A começar, no plano científico, as ações conduzidas pela equipa de José Artur Paiva do Hospital de São João e, na dimensão política, as atividades lideradas por António Correia de Campos para procurar envolver o Governo atual na solução do problema à escala global.

O duelo contra as resistências é para ganhar!

Nota
O artigo IV é dedicado a outros antimicrobianos & ONE HEALTH.

Francisco George
franciscogeorge@icloud.com