Pensar a Guerra

Considero-me militante contra qualquer guerra. Sou contra todas as guerras e todas as batalhas. São manifestações desumanas que deviam ser evitadas. Participei, por isso, em muitas manifestações contra a Guerra Colonial, tal como contra a intervenção dos Estados Unidos da América no Vietnam, mas, também a favor da Liberdade da Palestina. Em 1967, na Guerra dos 6 dias dei sangue na Embaixada do Egito em Londres.

Agora, perante a invasão da Ucrânia pelos exércitos russos, transmitida em direto pelas estações de televisão, a desumanidade das guerras é melhor percebida por todos. Mas, sempre assim foi.

Realço e assinalo aqui, alguns dos principais eventos que eu mesmo vivi desde a minha juventude e que contribuíram para fundamentar, em consciência, os princípios que guiam o pensamento sobre conflitos armados.

Antes de tudo, como explicar, em 1961, a racionalidade da decisão de Salazar mandar tropas para Angola “rapidamente e em força”, apenas para retardar a inevitável Independência que viria a acontecer em 1975? Quantos guerrilheiros africanos foram mortos nas guerras coloniais? Quantos inocentes foram massacrados? Quantos soldados ao serviço dos colonizadores perderam a vida?

Então, o que dizer dos Estados Unidos da América? A crise, em 1962, dos misseis nas Caraíbas que opôs Fidel Castro a John Kennedy? O bloqueio a Cuba? A longa guerra do Vietnam iniciada em 1955 e que se prolongou até à queda de Saigão, em 1975? O que pensar da crueldade do uso de napalm? E, em sentido diferente só no que se refere à magnitude do conflito, a invasão de Granada, em 1983, pelos rangers de Ronald Reagan? As guerras do Golfo, dos dois presidentes Bush? E nos Balcãs? Os ataques à Sérvia pela NATO, em 1999? O que dizer da independência do Kosovo? Como foi possível? Qual o papel da ONU?

E o Afeganistão? Invadido e ocupado pela URSS entre 1979-1989 e depois, também pelo Ocidente entre 2001-20121. Aquele horror do abandono de Kabul às ordens de Biden?

Reportagens e as sucessivas imagens dos confrontos na Ucrânia são impressionantes. Fazem pensar a Guerra que afinal voltou à Europa.

Vacinas e medicamentos, ontem. Bombas e tanques, hoje.

Paz e cooperação, ontem. Guerra e sanções, hoje.

Como compreender?

Os mesmos líderes europeus que tudo tentaram fazer para aumentar a produção e distribuição de vacinas, bem como de novos medicamentos para a Covid-19 na perspetiva do controlo da pandemia, surgem, agora, com discursos distintos que têm por objetivo mobilizar forças armadas para o Leste.

Ontem, todos pela Saúde Pública. Hoje, nos mesmos palcos, os mesmos governantes, anunciam a concentração de cada vez mais equipamentos bélicos e contingentes militares concentrados junto às fronteiras que separam a Rússia do Ocidente.

A estreita associação da Comissão Europeia à organização militar da NATO pode constituir, igualmente, causa de desassossego, visto que os países que integram o Tratado Atlântico não são todos Estados membros da União Europeia, como sucede com os Estados Unidos da América, o Canadá, Reino Unido e Turquia. Ora, por esta razão, há o risco dos seus exércitos serem envolvidos em operações no Leste Europeu.

Para todos aqueles que se interessam pela paz e para todos aqueles que se interessam pela saúde dos povos, a Guerra representa uma imensa derrota. É preciso pensar. O custo de uma única fragata é equivalente à construção e equipamento de muitos centros de saúde. Se a equação incluir um porta-aviões, os investimentos em saúde no mesmo montante, seriam suficientes para salvar a vida de muitos milhares de crianças em todos os continentes do Planeta.

Saliento a distinção entre matar ou salvar vidas.

A prosseguir o ambiente de guerra serão imensas as perdas. Morte e sofrimento evitáveis. Falhariam as diplomacias. Falhariam os líderes políticos. Todos iriam perder. Todos, menos os vendedores de armamento, em especial os Estados Unidos da América.

Paralelamente, julgo ser oportuno homenagear o jornalismo de qualidade que assegura a cobertura do Conflito, a partir da Ucrânia, em direto, junto aos bombardeamentos. É, neste contexto, que é merecida uma nota de apreço a todos os jornalistas e, em particular às jovens mulheres, enviadas especiais, que garantem serviços noticiosos nessas difíceis condições, nomeadamente Ana Peneda Moreira e Iryna Shev, entre outras.

Nota: Texto escrito ao ver reportagens televisivas da SIC NOTÍCIAS entre 23.02.2022 e 28.02.2022

Francisco George
franciscogeorge@icloud.com