Terramotos (I)

Artigo de opinião publicado no “Diário de Notícias” 15 fevereiro 2023

As imagens do Terramoto da Turquia e da Síria impressionam. Ninguém fica indiferente. Tantas mortes, feridos, casas arrasadas e cidades destruídas constituem um horror, injustamente imposto pela natureza.

É provável que a magnitude tão elevada e a dimensão da devastação tenham paralelo com outras grandes tragédias ocorridas ao longo da História. Uma dessas catástrofes aconteceu há quase 268 anos atrás em Lisboa.

Precise-se.

Em Portugal, como sempre acontecia a 1 de Novembro, a população preparava-se para comemorar o “Dia de Todos os Santos”. Mas, em 1755, pelas 9H30 da manhã, inesperadamente, Lisboa foi abalada por um intenso sismo de escala máxima que, pouco depois, foi seguido de ondas do estuário do Tejo e do Atlântico que galgaram as zonas baixas e inundaram aas ruas da cidade. Foi um enorme tsunami, igualmente destruidor.  Seguiram-se, pela tarde, incêndios que voltaram a castigar o que restara das ruínas das igrejas, conventos, dos palácios e das casas, sobretudo onde residiam as famílias mais pobres.

Os abalos, as ondas e aos incêndios deixaram 3/4 da cidade em poeiras e cinzas.

Ao primeiro abalo seguiram-se muitos outros aos longo das semanas seguintes.

Como se sabe, o rei José de Bragança entregara a governação do País ao todo-poderoso ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, que seria, primeiro, em 1759, Conde de Oeiras e depois, a partir de 1769, designado como Marquês de Pombal.

Esses trágicos acontecimentos marcaram a História de Portugal e, por isso, são descritos em livros escolares, destinados a alunos dos primeiros ciclos do ensino oficial. Invariavelmente, exaltam a figura do futuro Marquês centrada na sua indiscutível firmeza em reconstruir a capital no mesmo local. Em regra, todas as descrições escolares citam a famosa expressão então por ele proferida: “Há que cuidar dos feridos e enterrar os mortos” que apesar de óbvia parece querer traduzir a lucidez do governante. Mas, com frequência, essas exposições omitem a conduta política de Sebastião José como governante europeu conservador, déspota e violento. Não tolerava oposição, tudo sentenciava, tudo decidia, tendo chegado a nomear dois irmãos seus, um para Cardeal e outro para ministro dos negócios com o Brasil. Nepotismo sem barreiras no regime ditatorial que impôs.

O Terramoto foi arrasador. Os seus efeitos sentiram-se em muitas localidades desde o Algarve, ao Norte de África e ao Sul da Península Ibérica.

Os acontecimentos da Catástrofe sensibilizaram toda Europa. Logo que os primeiros relatos chegam a França, foram muitos os escritores, filósofos e cientistas que ensaiaram interpretar o fenómeno. O mais contundente terá sido o iluminista francês Voltaire que, pouco tempo depois, escreveu um magnífico poema sobre o Terramoto. Obra singular na época, absolutamente marcante, que devia ser incluída nos manuais escolares: “Poèmes sur le Désastre de Lisbonne et sur la Loi Naturelle”.

Também, o médico português Ribeiro Sanches que nascera em Penamacor em 1699 e que viria a morrer em Paris em 1783, a pedido do Marquês, escreveu um anexo sobre o Terramoto de Lisboa no livro que editou em Paris em 1756.

Essas obras, a de Voltaire e a de Sanches, voltarão a ser mencionadas, pela importância assumida na época, uma vez que foram escritas na capital das Luzes, ao mesmo tempo, imediatamente a seguir à grande Tragédia de Lisboa.

Francisco George
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