Curriculum vitae

CARREIRA
Francisco George nasceu em Lisboa, em 1947. É licenciado em Medicina pela Faculdade de Medicina de Lisboa desde 1973 (distinção).
Foi interno de medicina interna dos Hospitais Civis de Lisboa, no Hospital de Santa Marta.
Completou, em 1977, o Curso de Saúde Pública na Escola Nacional de Saúde Pública (Lisboa).
Médico especialista em Saúde Pública, foi delegado de saúde a partir de 1976, primeiro no concelho de Cuba e depois em Beja.
Como bolseiro da Organização Mundial da Saúde (OMS) fez o Curso Santé Familiale promovido pela OMS e pelo Centro Internacional de Infância (Paris) em 1978.
Entre 1980 e 1991 foi funcionário da Organização Mundial da Saúde. Para além de Bissau e Harare, foi consultor em missões que tiveram lugar em Pequim, Xangai, Brazzaville, Genebra, Rio de Janeiro, Maputo, Praia, São Tomé, Luanda, Bamako, Antananarivo, Maseru e Lusaca. Na qualidade de funcionário da OMS, em 1980, foi designado Chefe do Projecto de Desenvolvimento dos Serviços de Saúde, em Bissau e em 1986 Representante da OMS na República da Guiné-Bissau. Em 1990 desempenhou as funções de Epidemiologista do Programa Mundial de Luta Contra a SIDA como coordenador para a África Austral.
A seu pedido, uma vez terminada a licença de longa duração, regressou à carreira nacional.
Após concurso de provas públicas, obteve a categoria de chefe de serviço de saúde pública, desde 1992.
Foi nomeado Subdiretor-Geral da Saúde em 2001 e reconduzido em 2004.
Foi nomeado Diretor-Geral da Saúde, primeiro em 2005 e depois, no seguimento da Reforma da Administração Pública, em 2006 e novamente em 2009. A Comissão de Serviço foi renovada, por confirmação, no cargo de Diretor-Geral da Saúde e mantida depois da reorganização orgânica de 2012. Após concurso, tomou posse, outra vez, em 2013.
Foi membro do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, entre 2007 e 2010.
Foi, igualmente, membro do Conselho de Orientação do Instituto de Investigação Científica Tropical.
Foi, também, membro do Conselho Consultivo do Instituto de Higiene e Medicina Tropical desde 2015.
No quadro da União Europeia, em representação de Portugal, participou na reunião de peritos no domínio da saúde VIH/SIDA e no Comité de Doenças Relacionadas com a Poluição. Foi, desde 2001, membro do High Level Committee on Health, bem como do Health Security Committee e, desde 2005, participou nas reuniões dos Chief Medical Officers.
Em 2004, foi designado membro do Conselho de Administração do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (Estocolmo). Integrou o respectivo Comité de Programa.
Em representação de Portugal, na qualidade de Diretor-Geral, visitou oficialmente e participou em numerosas reuniões quer no âmbito da União Europeia quer de cooperação multilateral ou bilateral.
No contexto da Organização Mundial da Saúde participou, regularmente, nos trabalhos da Assembleia Mundial da Saúde e do Comité Regional da Europa. Foi membro suplente do Conselho Executivo da OMS (2005-2008).
Em 2007, foi chefe da delegação de Portugal à Conferência das Partes sobre a Convenção-Quadro para o Controlo do Tabagismo em Bangkok.
Integrou, como representante do Ministério da Saúde, o Conselho Supremo da Cruz Vermelha Portuguesa desde 2010.
Em 2014, na sequência da eleição de Portugal para o Comité Permanente da OMS Europa, foi nomeado como Representante do Estado Português para o triénio 2014-2017.
Foi, a partir de 2005, Professor Associado Convidado da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa.
É autor e co-autor de diversos artigos científicos publicados e de documentos sobre identificação, prevenção e controlo de riscos para a saúde pública. É relator e coeditor da publicação intitulada Health in Portugal divulgada, em língua inglesa, no âmbito da Presidência Portuguesa da União Europeia (2007).

É autor dos seguintes livros: “Guia de Clínica Médica”, destinado a ser utilizado nos países africanos de língua oficial portuguesa, publicado pela Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, maio de 1983); “Histórias de Saúde Pública” publicado em Lisboa, em 2004, pelos Livros Horizonte; “Prevenir Doenças e Conservar a Saúde”, editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (2019).
Na qualidade de conferencista convidado tem participado em numerosas reuniões científicas nacionais e internacionais.
É membro da Sociedade Portuguesa de Virologia, tendo sido Presidente do Conselho Fiscal até janeiro de 2014.

DISTINÇÕES
Em 2006 foi condecorado com a Ordem do Infante D. Henrique, Grande-Oficial, pelo Presidente da República, Jorge Sampaio.
Em 2014 recebeu a Medalha de Serviços Distintos do Ministério da Saúde, Grau Ouro, atribuída pelo Ministro Paulo Macedo.
Em 2017 venceu o Prémio Saúde Sustentável (negócios&accenture).
Por limite de idade cessou funções como Diretor-Geral da Saúde, em 20 de outubro de 2017. Na ocasião, recebeu do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a Grã-Cruz da Ordem do Mérito.
Também no mesmo ano foi agraciado pela Câmara Municipal de Lisboa com a Medalha de Mérito Social.
Em 26 de outubro de 2017 foi eleito Presidente Nacional da Cruz Vermelha Portuguesa, cargo que desempenha como voluntário, sem remuneração.
Em 2019 foi designado membro do Conselho de Cidadãos da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
Nesse ano, recebeu o Prémio Terra Justa 2019 (Fafe).
Ainda em 2019, foi agraciado com a Medalha de Ouro do Instituto Politécnico de Lisboa.

Frederico George (1915-1994) – Tio & Homem de Belas Artes

Irmão muito próximo de meu Pai, Frederico George nasceu em 1915 na casa de Campo de Ourique no número 75 da Rua Coelho da Rocha. Foi o último filho de meus avós Albert e Joaquina. Antes dele tinham nascido Helena, Alberto, Elizabeth, Ema e Carlos.

Frederico, como professor da Faculdade de Arquitetura aposentara-se em 1985. Desde então, minha Tia Margarida (Maya, como todos a conheciam) costumava insistir com meu Tio para viajarem a fim de poderem passar temporadas em ambientes exóticos. Quanto mais longínquo fosse o país, maior era esse prazer. Ora, nesse tempo, como os sobrinhos viviam nos trópicos, o itinerário da deslocação era mais fácil e dispensava hotéis. Assim sucedia e ainda bem. Foi muito bom para todos nós.

Juntos, percorremos a Guiné-Bissau, incluindo Bijagós, a Gâmbia, o Senegal e, depois, o Zimbabué.

Havia tempo para prolongadas conversas, sempre em redor dos mesmos temas, em especial agradavam-me as múltiplas explicações pormenorizadas sobre a nossa família inglesa, sobre arte e arquitetura. Eu, em geral, sentia muito prazer em ouvir respostas às perguntas que formulava, tal como gostava de ouvir a sua opinião sobre os mais diversos assuntos culturais.

Frederico George não gostava de falar de política. Para ele a democracia era natural. Relatava o funcionamento do sistema político em Inglaterra com notável orgulho. Tinha vivido em Londres, com seu irmão Alberto, pouco antes dos grandes bombardeamentos nazis. Detestava ditaduras.

Uma vez contou-me que tinha estado por alguns minutos com António Oliveira Salazar numa visita discreta que decidira fazer para verificar os trabalhos preparatórios da Exposição do Mundo Português, em 1940. Foi nesse dia que encontrou Salazar. Meu Tio Frederico, pacientemente, relatou ao Presidente do Conselho os detalhes dos painéis que estava a pintar. No final do esclarecimento, cumprimentaram-se sem calor nem elogios. Nada mais do que isso em ambiente frio e distante.

Lidei sempre muito de perto com meu Tio e meus primos Elsa e Pedro, mas foi só quando ele viajava para nossa casa em África, depois da sua aposentação, que fiquei a conhecê-lo verdadeiramente. Passei a perceber e a admirar a sua serenidade, a paciência, o gosto que demonstrava ter pelo ensino, a delicadeza dos seus gestos e, no fundo, a sua imensa classe. Falava muito sobre seus mestres, seus pares e dos seus alunos. Dedicara a sua vida a ensinar, a pintar e conceber projetos de arquitetura.

Frederico casara duas vezes. A primeira com Maria Luiza Conceição Silva, filha do Mestre pintor António Tomás Conceição Silva e a segunda com Maria Margarida, viúva de Fernando Mascarenhas, Marquês de Fronteira.

Por essa razão, internamente, entre família, a Tia Maya era, com carinho, tratada por “MARQUESA”. Não só não se importava, como até exibia um certo orgulho com tal tratamento, mesmo que dito em tom de gracejo.

Quando me perguntam como era meu Tio na intimidade, respondo sempre que era um artista e que como poucos, sentia as cores das plantas que, para ele, representavam um fascínio: as folhas, o porte das árvores e arvoredos, as cores das pétalas ou dos frutos. Tudo isso o encantava. Tudo isso era transcrito para a tela com imensa imperturbabilidade e rapidez porque trazia com ele uma maleta de madeira com pinceis e tintas. Sentava-se, acomodava-se e começava a pintar na explanada, no jardim ou na varanda. Produzia imenso. Em poucos minutos desenhava, primeiro a lápis e depois com pincel compunha o colorido que o impressionava mais (por vezes uma só pétala no meio de verdes de diferentes tons).

Aquela expressão artística traduzida pelo gosto em pintar de meu Tio, contrastava com a ausência de qualquer sensibilidade para as artes de meu Pai. Se bem que irmãos muito chegados em idade e em companheirismo, meu Pai era muito diferente. Não tinha qualquer aptidão para as Belas Artes. Quando eu colocava essa questão, para tentar perceber a génese de pessoas tão diferentes, sendo irmãos, meu Tio respondia-me que como era o mais novo costumava acompanhar seu Pai a visitar as exposições, enquanto meu Pai ficava em casa a estudar os livros de medicina. Era desta forma que explicava o seu gift e a admiração que tinha pelo irmão. Aliás, passavam a vida a dizer bem um do outro: Frederico nas Belas Artes e Carlos nos Hospitais Civis de Lisboa. Diria antes, uma questão de orgulho recíproco.

Lisboa, outubro 2017

Cuidado com as Curvas

No princípio do outono de 1976 iniciei os meus trabalhos como Delegado de Saúde no Concelho de Cuba. Anos inesquecíveis no Baixo Alentejo.

Portugal acabara de se libertar da Ditadura e de atravessar o período de governos provisórios. A Constituição da República, aprovada nesse ano, abriu uma época de esperança para todos e transmitiu novas energias.

Foi neste quadro que uma pequena equipa do então Centro de Saúde, provisoriamente instalado na Casa do Povo, lançou-se ao trabalho com ânimo redobrado e com a participação de cidadãos e famílias.

Uma das primeiras prioridades identificadas foi a necessidade de melhorar o abastecimento de água, quer na Vila quer nas sedes de freguesia ou, ainda, nos montes periféricos. A principal preocupação era promover a melhoria das frágeis infraestruturas de saneamento na perspetiva de cuidar da Saúde Pública e da preservação da qualidade do meio ambiente.

Para além da água potável, a ideia era reduzir a desordem na eliminação e no destino final de resíduos com a colaboração dos serviços da Câmara Municipal. Na altura, o Senhor Abrantes era o Presidente da Comissão Administrativa e logo assegurou o apoio possível. Mas, os recursos eram muito limitados e manifestamente insuficientes.

Era tempo de Cólera. Portugal estava confrontado com atividade epidémica de Cólera. Era, pois, preciso garantir a qualidade da água destinada ao consumo humano. Garrafas com solução de hipoclorito tinham sido enviadas pela Direção-Geral da Saúde. Também era preciso preparar os potes para serem cheios com “cloreto das lavadeiras” e, a seguir, mergulhados no fundo dos poços a fim de o cloro passar através das porosidades da cerâmica. Para tal, a localização dos poços em todo o espaço do Concelho fora assinalada em mapas militares.

A concretização do plano de luta contra a Cólera exigia a distribuição das garrafas com a solução de hipoclorito e a colocação dos potes na água dos poços.

Nestes trabalhos, relembro a importância desempenhada pelo Agente Sanitário do Centro de Saúde.

Um dia, depois de almoço “à do Jacinto” procurou-me. Estava ele em cima da motocicleta:

– Ó Doutor, monte a “cavalo” aqui atrás! Vamos a Albergaria dos Fusos aconselhar os habitantes a utilizarem as garrafas e a seguir colocar um pote a São Matias! Ora venha também, insistiu.

Olhei para ele desconfiado. Tirei as medidas ao banco da motocicleta e respondi-lhe:

– Porque não? Vamos! Cuidado com as curvas!

Francisco George
Setembro 2017